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sexta-feira, 25 de junho de 2010

ALICE RUIZ QUER SER CHAMADA DE POETA


Em verso e prosa, a escritora brindou Cubatão com sua participação no projeto Viagem Literária. A Biblioteca Central ficou lotada

O compromisso poético que Alice Ruiz assumiu é com a autoexpressão. Dona dessa e de outras considerações, a escritora esteve na Biblioteca Central da Cubatão, participando do Projeto Viagem Literária, nesta quarta-feira (23/6). A casa ficou lotada: presente para qualquer escritor que vem expor suas idéias, havia muita gente interessada em escutar o que Alice tinha a dizer. E ela começou com sua história de vida, costurando ponto a ponto junto às suas roupas poéticas: letra de música, poesias haikai e tradicional.

Lembrou do tempo em que sua família achava uma grande perda de tempo se dedicar à leitura. Escondia-se para ler e para escrever. “Descobri que nasci para fazer poemas lendo Mário Quintana. Poesia é uma vocação, a gente só trabalha isso com o passar dos anos”, afirmou. Ela disse que a sua carreira como escritora aconteceu por prazer e uma necessidade da alma. A autora não consegue se imaginar sem esse viés de autoexpressão. Para ela, todo ser humano precisa encontrar o que lhe garante essa manifestação de si mesmo: seja fazendo poesia, costurando, cozinhando, educando crianças e até mesmo construindo prédios... porque é um fator interior.

O bate papo com a escritora é parte do projeto Viagem Literária, da Secretaria de Cultura do Estado. Até o fim do ano, várias bibliotecas públicas paulistas receberão atrações mensais ligadas à literatura. E desde a primeira edição do projeto em 2008, Cubatão participa dessa grande “Viagem”. Foi o primeiro município da Baixada Santista a aderir ao Programa. O objetivo é estimular o prazer da leitura e formar novos frequentadores de bibliotecas públicas. Em agosto, vai ter Contação de Histórias, com outro escritor.

Para Alice Ruiz, a oportunidade de estar em contato com o público e saber o que as pessoas acham de seu trabalho é muito interessante, uma vez que ela atua em várias frentes na literatura. Já lançou 19 livros entre poesia, traduções e uma história infantil. E vem se dedicado bastante à poesia chamada haikai, que descobriu ao lado do também poeta Paulo Leminski (1944-1989), com quem já foi casada.

Originários do Japão, os poemas haikai têm características especiais como: falam sobre a natureza e coisas concretas; são curtos, de apenas três linhas; coloca o homem em harmonia com a realidade. Criados para refinar a sensibilidade de quem vivia nos mosteiros da renascença ou apenas por diversão na corte imperial, o haikai encantou Alice a ponto dela se aprofundar, estudar o tema e há algum tempo, e além de escrever, ministrar oficinas sobre o assunto. Ela diz que através dessa poesia vemos significados que só aprendemos com a natureza. “O haikai é praticamente uma fotografia em palavras”, considerou. Muitos de seus haikais podem ser lidos no site www.aliceruiz.com.br .Este é um deles:

“o vento passou
restou apenas
o aceno das árvores”.



Ela quer ser chamada de “poeta”: Alice Ruiz gosta de escrever sobre a vida. Para ela, poesia é a expressão do pensamento, traz consigo um sentimento contemporâneo, apontando para onde as coisas seguem. E por isso mesmo, quando perguntada sobre o papel da mulher na literatura brasileira, a escritora ponderou: “Temos que caminhar muito, ainda”.

Alice comentou que antigamente não existia “poetisa”, todo mundo era “poeta”. Com as batalhas do início do século passado, os homens foram para a guerra e as mulheres assumiram outros papéis, além de serem esposas e mães. Quando esses homens voltaram do front, essas mulheres também retornaram aos seus postos iniciais e passaram a ser chamadas de poetisas. “Eu vejo que naquele momento as pessoas não queriam que as mulheres pensassem. Poetisa é uma palavra carregada demais. Prefiro ser chamada de poeta”, afirmou, acidamente.

Uma das facetas mais admiráveis de Alice Ruiz é a de compositora, e ela também falou sobre isso. Enquanto o haikai encontra a fonte na natureza, a poesia e letra de música são inspiradas em “gente”. Já fez parcerias com Arnaldo Antunes, Itamar Assumpção, Ná Ozzetti, Zeca Baleiro, entre outros. Em 2005 lançou com Alzira Espíndola o CD Paralelas. Já garimpou pensamentos que se transformaram em lindas canções como “Milágrimas”, interpretada por Zélia Duncan.


Na tarde desta quarta-feira, Alice Ruiz recitou algumas letras, entre elas, “Sem receita”, que traz uma inesperada receita de frango. Muitos podem ter pensado: “receita de frango? Algo tão comum, cotidiano...”. Mas não é não: é poesia da melhor qualidade:

“Primeiro lenta e precisamente
Arranca-se a pele
Esse limite da matéria
Mas a das asas, melhor deixar
Pois se agarra à carne
Como se ainda fossem voar
...
E o peito nu
Com sua carne branca
Nem lembrar a proximidade do coração
Esse não!
Quem pode saber como se tempera o coração?”


Texto: Morgana Monteiro
Fotos: Rodrigo

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